30- O outro lado da moeda

        

Quando escrevi o livro “Entre o céu e a Terra”, o meu foco não foi o de questionar a participação Divina na criação, mas, de forma natural, em alguns momentos foram necessárias. Questionei o Big Bang da mesma forma que questionei a origem de Deus, porque, com o mesmo peso, a pergunta fica: O que existia antes? Os cientistas elaboram hipóteses fantásticas e os religiosos, simplesmente, dizem que nada existiu antes de Deus. Mas a pergunta continua.
         Criei este Blog para iniciar uma discussão sobre assuntos polêmicos religiosos que sempre me incomodaram e que nunca tinha coragem para falar, porque o medo imposto durante minha educação era maior. Quando falo sobre educação, digo escolar, porque meus pais foram fantásticos, me deixando livre para “voar” e hoje aponto a mesma direção para os meus filhos. Com este Blog percebi que tenho um forte “eco” em relação ao que penso e escrevo mas, como era de se esperar, despertei com a mesma intensidade a ira de radicais religiosos que, se eu não tivesse estabilidade emocional, poderia ter me arrependido de mexer nas suas feridas abertas. Mas hoje estou livre, posso “voar”, aprendi muito e me sinto em paz e feliz.
         Eu não desejo dizer a ninguém em que acreditar, mas para mim existem muitos assuntos contidos na Bíblia que podem ter uma segunda interpretação. Acho que não devemos aceitar porque está escrito ou, simplesmente, aceitar porque alguém disse que está certo. Devemos buscar constantemente evidências e gerar hipóteses para podermos dar um novo salto no conhecimento humano. De forma simples, foi o que fiz, mostrei meu ponto de vista. Para a minha felicidade, a grande maioria das pessoas que leram meus textos me apoiou e poucas fizeram críticas negativas. Estas críticas negativas foram muito bem assimiladas e que serviram de munição para novos textos. Eu entendo a revolta de alguns, porque é muito difícil se libertar das amarras das doutrinas religiosas, mesmo que estas sejam sem qualquer sentido.
         Alguns chegaram a dizer que eu me baseava no Velho Testamento e que este ficou para trás. Agora temos o Novo Testamento que serve como um norte para a conduta dos cristãos. Eu discordo porque não podemos desprezar o que está escrito no Velho Testamento, porque faz parte de um todo. Assim, seria muito fácil. Imagine um criminoso com uma ficha quilométrica de crimes e, de repente, essa ficha some, agora podemos considerá-lo um bonzinho? Não! Seus crimes continuam. Podemos até perdoá-lo, mas o que fez não pode desaparecer. Leia a página (A verdadeira Bíblia).
         Volto a dizer que não sou ateu(1). Hoje não tenho religião, porque não concordo com nenhuma. Mas este é um posicionamento meu e não imponho nem para meus filhos. Posso ir a uma missa com minha esposa, a um culto com minha irmã e a um centro umbandista com amigos. Para mim é a mesma coisa. Cada um com seu cada um!
(1)  Segundo o dicionário da língua portuguesa, o significado de ateu é aquele que nega a existência de Deus.  Mas, analisando no contexto das religiões, a definição de ateu é muito mais complexa, porque algumas religiões não cultuam deuses, como exemplo, o Budismo, Taoísmo ou Xintoísmo, portanto, sob esse ponto de vista, mesmo sendo extremamente religiosos, podem ser considerados ateus.
         Um católico segue a sua religião porque foi doutrinado nela, geralmente, sabendo muito pouco sobre outras religiões. Se tivesse nascido na Índia, provavelmente, acreditaria em Brahma e saberia pouco sobre Jesus Cristo. Se tivesse nascido em uma tribo indígena do Brasil colônia, acreditaria em tupã. Se aceitarmos a unidade de Deus, onipotente como o do cristianismo, não poderemos aceitar aqueles que não possuem um Deus supremo como acreditam os budistas ou existirem múltiplos Deuses como no hinduísmo. Portanto, a crença da população humana é muito heterogênea, implicando em uma incompatibilidade de conceitos. Quem está certo? Sugiro uma leitura nas páginas (Doutrina cega) e (Fé cega, faca amolada).
         Lembro do texto de Stephen Hawking “Deus criou o Universo?”. Neste texto podemos verificar uma análise se precisamos de um Deus para criar e controlar o Universo. Seu questionamento tem como base as leis da natureza e não um poder Divino. Considerando o poder Divino, como antigamente acreditavam, os deficientes físicos, como ele, viviam sob uma maldição imposta por Deus. Embora Hawking acredite que seja possível que ele tenha irritado alguém lá em cima, ele prefere pensar que tudo pode ser explicado de outra forma, apenas pelas leis da natureza. Se você aceita como ele que as que as leis da natureza são fixas, logo começa a questionar que papel Deus teria na criação. Faça uma leitura das páginas (A cópia do acaso) e (O Design inteligente).
         As leis da natureza criaram grandes problemas com a Igreja. Segundo Hawking, em 1277, o Papa João XXI se sentiu tão ameaçado pelas leis da natureza que decretou que elas eram heresias. Infelizmente a atitude do Papa não mudou em nada as leis físicas que governam a gravidade e, meses depois, o teto do palácio caiu sobre a sua cabeça. Deus quis assim?
         Nos séculos seguintes, a Igreja conseguiu resolver o problema com as leis da natureza, passou a aceitar que eram obras de Deus e, somente ele, poderia infligi-las. Pronto resolvido! Mas não foi bem assim, a cada momento a ciência vinha divulgando novas descobertas que iam de encontro ao que a Igreja aceitava. De forma desumana a Igreja reagiu, levantando as suas mãos de aço para matar, desprezar, humilhar e tentar desacreditar, de todas as formas possíveis os avanços científicos, como estivesse comandada por uma forma demoníaca. Era muito difícil manter uma Terra fixa no centro do Universo e o Sol girando ao seu redor, como ainda são difíceis de manter algumas crendices que ainda restam de uma doutrina ultrapassada. Ler as páginas (O Dilúvio), (A idade da Terra), (Adão e Eva), (A torre de Babel) e (A Arca da Aliança).
         Considerando a criação do Universo, segundo Hawking, para se ter um Universo, temos que ter 3 ingredientes básicos: matéria, energia e espaço que foram originados durante o Big Bang. Agora temos que questionar de onde veio toda esta energia. Para alguns, é aqui que entra a ação de Deus, portanto, o Big Bang foi o momento da criação. Entretanto, a ciência pode apresentar uma explicação diferente. Retrocedendo no tempo, o espaço fica cada vez menor até chegarmos ao ponto inicial, a singularidade. Neste momento o tempo para e não é possível chegar a um tempo antes do Big Bang, por que não havia nada antes. Agora encontramos algo que não possui uma causa, porque não havia o tempo onde a causa não podia existir, desta forma, não existe um criador, porque não existe o tempo para o criador existir. Assim, como o tempo foi criado no momento do Big Bang, não poderia ter sido criado por ninguém e por nada. Mas continua a pergunta: O que existia antes? Nada? No meu simples modo de entender, teremos que aguardar mais tempo até que novas evidências apareçam e novas hipóteses surjam. Ainda somos muito pequenos para entender.
         Mas a fé é um forte pilar. A melhor definição de fé pode ser observada em Hebreus (11:1) “Fé é o firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que não se vêem”. Portanto, basta acreditar. Se um religioso acredita que Deus originou o Universo, está perfeito. Podemos acreditar em qualquer coisa, até em duendes, mas ficamos apenas neste ponto, só acreditar. Eu, sinceramente, tenho dificuldades de aceitar que existiu o Big Bang e pronto. Nada existia antes? As verdades são momentâneas. Aceitamos que a velocidade da luz é a maior existente e não pode existir nada mais veloz no Universo. Entretanto, parece que vamos ter que mudar o nosso entendimento sobre a velocidade máxima, porque existem resultados que apontam que os neutrinos podem acelerar mais que a velocidade da luz. Já estou achando que, neste ponto, precisamos ter fé para acreditar no Big Bang e ponto final. Eu acho que, num futuro próximo, descobertas nos mostrarão coisas fantásticas que jamais poderíamos imaginar. Assim, daremos um novo salto científico e novas perguntas surgirão, junto com novas religiões com seus novos dogmas. Ler a página (Ciência e Religião).
         Eu não sou contra as religiões, só não acredito nelas. Cada pessoa se sente feliz de forma diferente, e isso é o importante. Eu sou totalmente contra posições radicais sem fundamento ou simplesmente crendices. Sou contra adotar determinadas passagens bíblicas como verdades enquanto outras são ditas metáforas. A posição da Igreja mudou muito com o passar dos tempos, onde verdades foram transformadas em metáforas e assimiladas pelos seus seguidores. Outras são mais difíceis de serem contestadas porque são extremamente abstratas, mas todas são metáforas. Ainda existem pessoas capazes de acreditar em Adão e Eva(2), o Dilúvio(3), que a idade da Terra é menor que 10 mil anos(4) e até no arrebatamento(5) entre outras passagens bonitas que só podem ser consideradas como mitos e lendas e que foram muito importantes para passar determinadas mensagens.
         Tenho pena dos criacionistas fixistas que lutam em uma guerra contra a Teoria da Evolução. Existe um grande ódio por trás das atitudes destas pessoas que, muitas vezes se comportam como se estivessem na Idade Média. Se pudessem queimariam na fogueira todos os evolucionistas e todos os seus livros seriam banidos e destruídos, apenas para poderem ficar tranquilos com suas crendices obsoletas: “É assim porque está escrito! É assim porque é!”. A pena que sinto destas pessoas está relacionado ao tempo que se esgota, ao encurtamento histórico dos seus argumentos contra uma ciência dinâmica que amplia em progressão geométrica os nossos horizontes.
         Todas as ações e comportamentos são com bases em um único livro, considerado “inspirado” por Deus e escrito por homens. Este livro, a Bíblia, possui esta importância porque ao longo de muitos anos as pessoas vêm dizendo que é “inspirado”, se concretizando apenas no ato da fé e nada mais. No meu simples modo de pensar, a Bíblia é somente mais um livro. Um antigo livro com partes maravilhosas e de grande importância histórica que foi escrito por muitos homens e lógico, com erros graves(6), sendo modificado e adequado aos mais diversos interesses das épocas, até ter o formato de hoje(7), mas não “inspirado” (8). Ganhou esta conotação bem depois de Cristo somente para ser importante e inquestionável, servindo de base para a doutrinação do povo. A ideia foi boa, foi um grande sucesso.
         O grande problema é o medo. Este medo está em todas as partes da Bíblia, principalmente, no Velho Testamento. A imposição pelo medo é nítida, onde se você se afasta do que está escrito, será castigado utilizando as formas mais bárbaras(9). O Papa Leão I, ano 440, para impor mais respeito prescreveu "Resistir a sua autoridade seria ir para o inferno", portanto um disseminador de um “vírus” do medo. Os religiosos radicais foram impregnados por esse “vírus” que destruiu e destrói a capacidade de reflexão e a possibilidade de ampliação dos horizontes, porque o pecado sempre existiu e o inferno o rodeia. Os religiosos radicais são incapazes de pensar de outra forma e, com sabedoria e razão, analisar os fatos. Quando algum assunto foge de seu controle e expõe sua cabeça para fora da névoa contaminada, se desespera por não saber como se comportar porque observou o óbvio, a realidade. Ler a página (A força da imagem).
         Eu sei o que é doutrinação religiosa. Estudei em escolas de padres e minhas irmãs em escolas de freiras. Eram as melhores escolas que existiam na cidade onde morávamos. Todos os meus comportamentos dentro da escola tinham que ser rigorosamente aprovados pelas normas rígidas da religião. Era obrigado a assistir missas semanais que duravam uma hora e quarenta minutos (duas aulas) e aulas de religião com massacres ideológicos. Agora imaginem a minha cabeça infantil, com estes bombardeios e nem batizado eu era. Só não entrei em “parafuso” porque tinha uma família excepcional, diferente de tudo o que conheço até hoje. Meus pais foram “iluminados” e “inspirados” na criação, conduzindo quatro filhos ótimos para o caminho do bem e da razão.
         Nós somos ainda muito limitados quanto aos conhecimentos. Ainda nos deixamos envolver por mitos, lendas e rituais, da mesma forma que nossos ancestrais. Nossa ciência, embora alguns achem que somos o máximo, somos muito pequenos, apenas um grão de poeira no espaço e queremos comandar o que existe no Universo. Temos muito que aprender. Pedindo licença aos meus amigos físicos pelos equívocos propositais que vou cometer, mas utilizando como forma didática, vou solicitar que imagine uma cor diferente de todas que já viu. É possível? Não! Agora, se uma pessoa lhe mostra esta cor nova, certamente você vai admirar e guardar no seu “bando de dados” e vai tocar a sua vida sem problemas, apenas com mais uma informação que era impossível antes da observação. Este exemplo simples mostra que não podemos aceitar o que até o momento era impossível, apenas com novos fatos passamos a ter evidências para novos conhecimentos.
         Eu tenho certeza que a ciência e a religião podem andar no mesmo caminho, embora discordando sobre alguns pontos de vista. Um cientista pode ir à Igreja e ser devoto, curtir o seu lado espiritual e se sentir bem. Da mesma forma, um religioso pode aceitar os avanços científicos sem modificar suas bases religiosas. Devemos ser racionais e nunca radicais e sempre respeitar e saber que existe o outro lado da moeda.

Edson Perrone
ecperrone@gmail.com